Opiniões sobre a Lei Rouanet podem divergir, mas existe um ponto em que todas as vozes convergem: a concentração de patrocínios na região sudeste é um dos desafios do Ministério da Cultura na operacionalização do mecenato. Em 2015, por exemplo, o eixo São Paulo-Rio ficou com 68,7% do total de aportes a projetos culturais no país, que chegou a R$ 1,18 bilhão. “Uma forma de mitigar essa concentração é abrir o patrocínio para empresas tributadas pelo lucro presumido [regime simplificado que presume a receita bruta para determinar a base de cálculo do imposto de renda]”, afirmou Marcelo Calero, ministro da Cultura do governo interino, em encontro em São Paulo, na manhã de quarta (24). Durante o evento promovido pela Comissão de Direito às Artes da OAB-SP, Calero disse que articula com o Senado mudanças na lei, entre as quais estão contempladas alterações que permitam maior abrangência de pessoas jurídicas nos patrocínios pelos Estados. Pelas regras atuais, somente empresas tributadas com base no lucro real -boa parte delas concentradas na região sudeste- podem apoiar projetos culturais na Lei Rouanet. De acordo com o ministro, ao abrir a possibilidade de patrocínio a empresas com tributação baseada no lucro presumido, a captação se pulverizaria nos outros Estados. Em junho de 2015, a deputada federal Renata Abreu (PTN-SP) apresentou projeto de lei que insere pessoas jurídicas desse regime na Rouanet. A proposição está parada na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara. ACABAR COM A ROUANET? NUNCA! Calero comenta que, após a Polícia Federal deflagrar a Operação Boca Livre, “as pessoas perguntam quando vou acabar com a Rouanet, e a resposta é ‘nunca'”, pois “ela é responsável, anualmente, por mais de 3 mil projetos e pela manutenção de museus, bibliotecas e outras instituições perenes”. Ele lembra que a operação de desarticulação da quadrilha acusada de desvios na ordem de R$ 180 milhões em projetos da Rouanet surgiu dentro do ministério, no intuito de coibir ações do gênero. “Sempre vai haver bandidos que se valem de métodos legais para burlar a Rouanet e essas pessoas devem ser tratadas como são, bandidos”, afirma. Sentado no centro da mesa onde, numa das pontas, estava o cantor Lobão, crítico ferrenho do Partido dos Trabalhadores e grande articulador pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff, o ministro reafirmou que, ao chegar no MinC, encontrou a pasta “em estado de caos”. Ressaltou que o ministério havia acumulado dívidas de mais de R$ 1 bilhão e “não tinha dinheiro para sobreviver até o fim do ano”. “Havia editais não pagos e até fornecedores sem receber”, afirmou. O “caos” também estava instalado na parte organizacional, disse Calero. Secretarias se sobrepunham umas às outras e “servidores de carreira estavam desestimulados”, o que o levou a fazer uma reestruturação geral na pasta -inclusive com exonerações de pessoas que “caíram de paraquedas” e assumiram cargos de confiança. Ele próprio garante saber que sua posição é transitória. “Tenho noção da efemeridade: eu ‘estou’ ministro da Cultura”, diz. “Posso voltar a ser apenas um carioca da Tijuca a qualquer momento -e acho que a política precisa de mais gente comum, de mais ‘cariocas da Tijuca’.”
Fonte: Bem Paraná