A produção de proteína em grande escala para um medicamento contra o câncer, que está sendo pesquisado em parceria com o Instituto Butantan, e o desenvolvimento, inédito no Brasil, de uma liga para criação de superimãs para uso em turbinas eólicas e discos rígidos de computadores são algumas das pesquisas recentes desenvolvidas pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas).
Desde a sua fundação, em 1899, o Instituto permanece no centro das pesquisas aplicadas à indústria no Brasil. “A inovação faz parte do DNA do IPT”, costuma dizer o diretor-presidente Fernando Landgraf, responsável pelo planejamento estratégico do Instituto, com foco na ampliação da cultura da inovação.
Em entrevista ao Portal do Governo Estado, acompanhado pelos pesquisadores Maria Filomena de Andrade Rodrigues, à frente de projetos de Biotecnologia Industrial, e João Batista Ferreira Neto, que coordena os projetos de pesquisa em metalurgia, Landgraf conta detalhes sobre a trajetória do Instituto, que nasceu, na virada do Século 20, como um laboratório da renomada Escola Politécnica (Poli) e era chamado de Gabinete de Resistência dos Materiais.
O Instituto participou ativamente do desenvolvimento da indústria nacional em movimentos decisivos da cena econômica brasileira. Como laboratório da Escola Politécnica, o IPT tinha como objetivo medir as propriedades de produtos industriais que começavam a ser fabricados no Brasil, conta Landgraf.
Foi assim no início das pesquisas com cimento, no começo do século 20, quando o emprego do material era a grande novidade na construção civil; continuou com o advento da indústria automobilística, nos anos 1950, e nos anos subsequentes, na década de 1980, com a construção de barreiras para as grandes usinas de energia hidroelétricas e a busca pela auto-suficiência energética; no processo caracterizado pela substituição das importações no Brasil, e, no presente, com o movimento de inovação radical.
O cimento e a medida da composição química do produto começaram a ser dimensionadas pelo IPT, assim como as características mecânicas das barras de ferro que passaram a ser fundidas naquele momento pela indústria brasileira. Atualmente, essas duas áreas estão entre as expertises do Instituto e servem de base para o desenvolvimento de outras pesquisas.
“A primeira indústria de cimento foi criada (em 1893) por Rodovalho (comendador Afonso Proost Rodovalho)”, conta Landgraf. Até hoje a importância do medir se mantém, enquanto medimos as características de processos que são desenvolvidos para serem usados pelas indústrias”, afirma.
Nos anos 1950 e 60, e mesmo no início dos 70, quando a criação da infraestrutura brasileira estava muito ligada a investimentos do Estado, o IPT teve grande participação no apoio às empresas de engenharia que estavam construindo as usinas hidroelétricas em São Paulo e no Brasil.
Grande parte dos estudos geológicos que garantem a estabilidade de uma barragem foram desenvolvidos no IPT. “Nós todos sabemos da importância de uma barragem, principalmente depois do acidente de Mariana, em Minas Gerais, pois todas as barragens das usinas hidroelétricas foram estudadas e desenvolvidas no IPT”, ressalta o seu presidente.
A fase do aprender tecnologia dá lugar à inovação
Nos anos 50, quando nasceu a indústria automobilista, inúmeras empresas foram criadas dentro do IPT. “As tecnologias foram ‘apreendidas’, não desenvolvidas, pois nesse momento ainda estávamos copiando. São tecnologias que não existiam no Brasil, e que foram copiadas no IPT e aprendidas a serem feitas no Brasil, por empresas brasileiras criadas para levar essas ferramentas adiante”.
O caso mais espetacular, conta Landgraf foi o de Ary Torres, “aquele que dá nome ao viaduto da (avenida) Bandeirantes”. Ex-pesquisador do IPT, ele acompanhou a tecnologia de produzir a vídia, metal duro utilizado nas ferramentas de corte, como as furadeiras, hoje tão comuns em nossas residências.
O pesquisador aprendeu a fazer o material nos Estados Unidos e o IPT desenvolveu o projeto de fabricação que deu origem à criação da empresa Brassinter, até hoje de propriedade da família de Ary Torres.
No anos 80, durante o processo de substituição das importações no Brasil, muitos materiais foram adaptados no IPT para o emprego no mercado. O IPT, como recorda Landgraf, chegou a ter fábricas, que funcionavam em três turnos, para substituição de importações.
Mais recentemente, o IPT ingressou na era da inovação radical. “Agora, já não se trata de acumular conhecimento em tecnologia, mas de desenvolver coisas que não foram feitas em nenhum lugar do mundo, explica Landgraf.
Dentre as pesquisas desenvolvidas nos últimos quinze anos, o presidente do IPT destaca a criação do plástico biodegradável, “integralmente desenvolvido pelo IPT, em parceria com a USP”. No Brasil, o plástico biodegradável foi desenvolvido a partir de uma bactéria encontrada no solo das plantações da cana-de-açúcar, conta a pesquisadora Maria Filomena, que participou do projeto no Laboratório de Biotecnologia do IPT: “Essa solução foi desenvolvida no Brasil, a partir das pesquisas do IPT”, afirma.
Inovar custa caro
Outra grande conquista do IPT foi a utilização dos restos do material produzido nos alto-fornos das siderúrgicas que teriam de ser descartados de alguma forma pelas indústrias. São quase 4 milhões de toneladas de produtos por ano que saem dos fornos das aciarias e que, em razão das pesquisas do IPT, são utilizados para produzir uma liga de cimento. O projeto coordenado pelo pesquisador João Batista Ferreira Neto foi desenvolvido com base em critérios de sustentabilidade.
“Imagina arranjar um local para descartar essa quantidade de material, que representa uma ameaça ao meio ambiente”, afirma Landgraf. “As composições químicas precisavam ser alteradas e foi nisso que trabalhamos: um processo de modificação dessa escória para aplicação na produção de cimento”, completa. Esse trabalho foi feito com uma das maiores produtoras de cimento do Brasil, afirma Fernando Landgraf, que contratou esse serviço ao IPT.
“Investir em inovação é um negócio que custa caro, e a nossa indústria é conservadora”, afirma Landgraf. Em geral, a indústria nacional só quer investir no que é seguro e vai dar lucro. Ela investe, mas comparado com outros países investe pouco. Enquanto os países desenvolvidos investem 3% do PIB em pesquisa, o Brasil investe 1%. “A grande diferença é o investimento da iniciativa privada, que é menor aqui do que lá”, conclui.
Hoje, as empresas investem mais em inovação, e esse fato se deve à três movimentos recentes, dois do governo federal e um do Estado de São Paulo, que trouxeram, segundo Landgraf um aporte no compartilhar o risco que está embutido na inovação. “O investimento maior em inovação das empresas vem das linhas de financiamento do BNDES (Funtec) e uma novidade que chama Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial), e, mais recentemente, a Fapesp, que também tem apoiado esse trabalho”, explica.
Landgraf vê semelhanças entre o movimento pela inovação com o da qualidade, ocorrido em um momento anterior que passou do discurso e do marketing para a aplicação prática. Ele considera que há um interesse crescente das empresas pela pesquisa em inovação, tanto as nacionais como as de capital estrangeiro com sede no Brasil. As universidades também orientam o foco para a pesquisa aplicada e a Fapesp está incentivando ao criar linhas de pesquisas com grandes empresas, como a Mahle, Shell e Oxiteno.
Esta última apóia o projeto Próteses, desenvolvido em conjunto com a AACD (Associação de Apoio à Criança Deficiente) e CBMM (Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração), que é um outro projeto inovador, a partir de uma liga metálica fundida a laser e criada pelo Laboratório de Processos Metalúrgicos do IPT.
Apoio às pequenas
O foco das pesquisas de inovação do IPT não está orientado apenas para a grande indústria, mas também para as pequenas empresas. O problema da pequena empresa é não possuir dinheiro para as pesquisas que envolvem alto grau de risco, mas com o apoio de programas como o PIPE da Fapesp, Sebrae e Embrapii, está havendo uma inflexão com o aumento de pequenas e médias em processos de inovação. O IPT orienta as empresas na obtenção de linhas de fomento federais e estaduais.
O apoio à micro e pequena empresa também conta com parceria da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo. É o caso da empresa Treetech, que utiliza os laboratórios do IPT para ensaios climáticos, elétricos e mecânicos, e está exportando tecnologia para 37 países, ou da empresa Angelus, que desenvolve um cimento odontológico a partir de pesquisas da nanotecnologia, que torna mais rápidos os procedimentos nos consultórios e a recuperação do paciente. O apoio também vem na agência Desenvolve SP com linhas de financiamento do Finep.
Inovação é uma exigência do mercado e é vital para a sobrevivência e competitividade das empresas brasileiras. O trabalho do IPT demonstra que a pesquisa aplicada pode representar a quebra de paradigmas na gestão de tecnologias.
Fonte: Portal do Governo do Estado de S. Paulo