As empresas brasileiras e instituições de ciência e tecnologia (ICTs) que investem em pesquisa e desenvolvimento (P&D) vão terminar o ano de 2015 apreensivos. A Medida Provisória (MP) 694/215, que suspende os benefícios concedidos pela Lei do Bem (11.196/2005), pode virar o ano sem ser analisada pelo Congresso Nacional. Com isso, conforme determina a MP, a partir do próximo ano as empresas e ICTs privadas, sem fins lucrativos, deixarão de excluir do lucro líquido os percentuais aplicados em P&D.
A medida provisória chegou ao Senado Federal em 6 de setembro. A validade dela já foi estendida e passará a trancar a pauta a partir de 20 de janeiro. A comissão instalada para analisar matéria se reunirá pela primeira vez nesta terça-feira (8) para apreciar requerimentos. O presidente do grupo é o deputado Eduardo Cury (PSDB-SP) e o relator da matéria é o senador Romero Jucá (PMDB-RR). A MP 694 faz parte do pacote de medidas anunciado pelo governo federal, em setembro, para minimizar o déficit orçamentário. De acordo com a equipe econômica, serão economizados R$ 2 bilhões.
Os impactos na indústria e na comunidade científica serão maiores. De acordo com um levantamento da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei), em 2013, 1.158 empresas inovadoras de 22 unidades da federação utilizaram os benefícios da Lei do Bem. O montante de renúncia fiscal aplicado em P&D foi de aproximadamente R$ 2 bilhões. Os recursos dessa legislação estão vinculados, em média, a 50,8% dos projetos de pesquisa das empresas que utilizam o benefício e suporta, de forma exclusiva, o trabalho de 52% de seus pesquisadores.
A comunidade científica e tecnológica se mobilizou para sensibilizar os parlamentares para alterar o texto da MP. Em outubro, durante audiência pública na Câmara dos Deputados, o presidente da Associação Brasileira das Instituições de pesquisas Tecnológicas e Inovação (ABIPTI), Julio Cesar Martorano, alertou que haverá evasão de pesquisadores e os impactos também serão sentidos na produtividade e, consequentemente, na competitividade das empresas.
“Haverá uma quebra nos incentivos para que empresas invistam em P&D. Esse hiato afetará projetos significativos que estavam em andamento”, lamentou Martorano. “Não se estoca cérebro e nem gente. Ou seja, se não há projetos para desenvolver haverá evasão desses profissionais. As boas cabeças saem. No fim das contas, estamos dizendo que o País perde com essa MP”.
Entidades do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação (SNCTI) também assinaram uma carta em repúdio à MP 694 que foi encaminhada para a presidente Dilma Rousseff. Esse manifesto teve apoio de mais de 50 instituições do País.
Política pública
O governo federal batalha desde 2004, quando foi aprovada a Lei de Inovação (10.973), o primeiro marco legal da CT&I, para impulsionar o investimento privado em ciência, tecnologia e inovação. A Lei do Bem é o único incentivo tributário, auto declarável, oferecido pelo governo federal para quem investe em inovação.
Na prática, as empresas e as ICTs privadas que investiam em P&D devem diminuir esses investimentos significativamente. Dados do relatório “Análise do uso dos incentivos fiscais à inovação em 2012”, realizado pela Inventta+bgi, mostram que, de 2006 a 2012, as empresas habilitadas investiram em despesas de capital e de custeio um total de aproximadamente R$ 45 bilhões, sendo que o valor total de renúncia fiscal do governo federal foi em torno de R$8 bilhões, o que representa 17% do total investido em P&D.
A Anpei destaca que o incentivo fiscal foi um dos principais viabilizadores econômicos para a implantação de 15 novos centros empresariais de P&D de grande porte nos últimos quatro anos no Brasil e foi relevante para a produção de, no mínimo, 20 mil novos produtos ou aperfeiçoamentos tecnológicos de processos para a sociedade e para a economia brasileira.
No ano base de 2012, aproximadamente 92% das empresas que utilizaram os benefícios da Lei do Bem estavam nas regiões Sul e Sudeste e foram responsáveis por 93% do valor apurado de benefício fiscal. Os estados que possuem maior concentração de empresas que utilizam a Lei do Bem são São Paulo (46%) e Rio Grande do Sul (18%), seguidos por Paraná, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Santa Catarina (aproximadamente 7% cada). No ano base de 2012, 8 estados não tiveram empresas habilitadas nos incentivos fiscais à inovação tecnológica, sendo 5 deles pertencentes a região Norte.
Fonte: Agência Gestão CT&I